"Somethings in the rain" - playlist da série

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

MELANCÓLICO TRINADO - Elen de Moraes





 Melancólico trinado


Elen de Moraes Kochman


Minha cidade amanheceu assim...
Tão fria e cinzenta... como a saudade
Que rasga meu peito... que não tem fim!
Magoada lembrança que hoje me invade!

Aquele adeus que outro dia deixaste
Atrás de ti, a ocupar teu lugar,
Tirou-me lágrimas quando o acenaste,
Dizendo nunca mais aqui voltar.

A névoa trouxe consigo um sanhaço
Que, encolhidinho, triste e solitário,
Pousou na amurada do meu terraço
E destravou seu canto solidário.

A minha dor certamente entendeu,
Porque - com seu merencório trinado -
O seu pranto veio juntar ao meu.
E o nosso amor já desesperançado,

Chorado em contas de um gasto rosário,
Acautelei, para não mais sofrer.
Lembranças tuas guardei num sacrário.
E só então pude voltar a viver.


domingo, 23 de janeiro de 2011

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

OUVINDO ESTRELAS - Elen de Moraes


Revisitando...

Pelo aniversário de 92 anos da minha mãe Maria
OUVINDO ESTRELAS...

Elen de Moraes Kochman


Parece que foi ontem! Ainda te vejo embaraçada e sorridente entre o farfalhar das folhas outonais, amarelecidas, que coalhavam o chão daquela pracinha e o assovio do vento que, brincalhão, rodopiava por entre as árvores centenárias, remexia os teus cabelos e levantava a tua roupa... Sem entender a tua preocupação, me divertia com o esforço inútil que fazias, ora em tirar as mechas revoltas do rosto, ora em segurar a saia ampla, de tecido sedoso e flores miúdas, junto ao copo frágil e delicado, com a intenção de protegê-lo dos olhares curiosos.


Minhas mãos de inocência, buscando te ajudar, procuravam desviar a direção do vento para que não desmanchasse os cachos dourados que escorregavam pelos teus ombros e reluziam, preguiçosamente, sob os raios mortiços do sol, naquelas manhãs outonais.


O teu jeito altivo e seguro que tanto admirava, me dava certeza da tua proteção e de como estavas atenta a tudo que acontecia à nossa volta. 


Achava maravilhoso aquele teu meio sorriso sem abrir os lábios, que ressaltava as covinhas que se formavam ao lado da tua boca, que eu apertava, às gargalhadas, só para sentir teus beijos nas minhas bochechas afogueadas...


Tudo em ti era bonito e assentido por mim. Só os teus longos silêncios eu não aprovava, porque o som da tua voz me era tão bonito e melodioso quanto o doce sonido das águas que rolavam sobre as pedras da pequena cascata do parque, que eu não cansava de ouvir... 


Quando reclamava tua atenção, me abraçavas pedindo que eu  fosse brincar, dizendo querer aproveitar aqueles instantes, a sós, para conversar com a tua alma. Um muxoxo e uma sacudidela de ombros eram meus sinais de descontentamento, porque o trinado dos pássaros, os galhos pesados das velhas árvores balançando suas copas, umas de encontro às outras, sim, esses sons eu distinguia, no entanto, tua alma envolta em mistérios, não conseguia ouvir.

Entre magoada e distraída, seguia o movimento do teu dedo indicador sobre os teus lábios, numa delicada exigência de silêncio. Teus olhos pediam, uma vez mais, que eu não risse alto, não fizesse tantas perguntas ou pisasse com tanta força nas folhas mortas, batendo os pés, como gostava de fazer, para ouvi-las chiar. 


Sem me dar conta, prendia a respiração enquanto policiava os teus olhos que se soltavam dos meus e se voltavam em direção ao céu e ali permaneciam, perscrutando a imensidão. Insistia, querendo saber sobre tua alma, mas sem nenhum resquício de impaciência, apontavas para meu peito e dizias que ali morava minha alma, porém, para ouvi-la, teria que conversar com as estrelas... Cada vez eu entendia menos, porque não via estrelas no céu durante o dia. Explicavas que elas estavam lá, mesmo que não as víssemos. 


Depois de tantas e complicadas perguntas e das tuas respostas sem nexo, para o meu néscio entendimento, distraía-me correndo, ora atrás das numerosas borboletas pousadas na grama, ora tentando agarrar as folhas que se desprendiam dos galhos e voavam levadas pelo vento. Algumas vezes interrompia minhas brincadeiras e as tuas silenciosas conversas, para que prendesses uma flor nos meus cabelos cinza, encaracolados, tão sem graça e tão diferentes dos teus!


Vigiava-te de longe: tinha medo que o vento te levasse, tinha medo que o som da tua alma te encantasse e que partisses em busca de alguma coisa que eu não sabia o quê, mas que vivias a procurar... Às vezes, tinha a impressão de te ouvir falando sozinha; outras, lágrimas pareciam toldar teus belos olhos cor de mel. Nesses momentos, corria para os teus braços achando que uma fada pudesse te encantar e te levar de mim. Com esses pensamentos, pendurava-me em teu pescoço e te apertava de encontro ao meu coração, para que não fugisses. Então, num gesto de carinho, encolhia meu pescoço para reter tua cabeça junto à minha. Como era gostoso, naqueles instantes, sentir teus braços protetores ao redor da minha cinturinha de criança! 


As horas não eram intermináveis porque não as contávamos. Simplesmente aconteciam. Foram tantas manhãs, tantos abraços, tantos sorrisos... e tantas crianças que chegaram naquela casa! E tantos anos que se passaram...
...


Teus cachos dourados deram lugar ao prateado dos cabelos curtos; teu corpo esguio e perfeito, curvou-se levemente; teu andar desacelerou-se e o teu meio sorriso perdeu-se em divagações, sem, no entanto, deixar de lado a ternura de sempre.

Ainda te vejo conversando baixinho... Talvez, agora, com as três “crianças” - das seis que povoaram tua vida – e que, apressadas, partiram, deixando-te atônita, com a dor estampada no olhar, cujo brilho o tempo não apagou e que, muitas vezes, imerge nas lágrimas abundantes que não consegues controlar.


Agora, já não corro atrás das borboletas, nem tento impedir que o vento faça esvoaçar os teus cabelos, tampouco tenho medo que uma fada madrinha te roube. Entretanto, com firmeza, entrelaço minhas mãos nas tuas, amorosamente, para reter-te, porque tenho medo, isto sim, de me perder de ti, antes que nosso tempo termine.


Hoje posso ouvir o teu silêncio e conversar com as estrelas, em pleno dia... Agora, mãezinha querida, consigo escutar as inefáveis melodias da tua alma que se desprendem do teu peito e se elevam aos céus, em feitio de oração.


Atualmente, todas as noites, ao fechar a porta do meu quarto que dá para um terraço,
olhando o céu, vejo uma estrela de brilho intenso e não resisto em dar-lhe boa noite 
e desejar-lhe  bons sonhos, porque agora, desde 21-02-2016,
 mãezinha é, também, uma estrela.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

XXXVI O Guardador de Rebanhos Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)





O guardador de rebanhos
XXXVI

Alberto Caeiro
(Fernando Pessoa)



E há poetas que são artistas
E trabalham nos seus versos
Como um carpinteiro nas tábuas! ...


Que triste não saber florir!

Ter que pôr verso sobre verso, 
como quem constrói um muro
E ver se está bem, e tirar se não está! ...



Quando a única casa artística é a Terra toda
Que varia e está sempre bem e é sempre a mesma.
Penso nisto, não como quem pensa,
 mas como quem respira,
E olho para as flores e sorrio...
Não sei se elas me compreendem
Nem sei eu as compreendo a elas,
Mas sei que a verdade está nelas e em mim
E na nossa comum divindade
De nos deixarmos ir e viver pela Terra
E levar ao solo pelas Estações contentes
E deixar que o vento cante para adormecermos
E não termos sonhos no nosso sono.


Extraido do "Eu profundo e os outros Eus"

CORPO ATEU - Elen de Moraes




Corpo ateu

Elen de Moraes Kochman




Volta amor!
Vida sem ti é deserto,
terra árida... sertão.
É seca, é fome, é morte,
é futuro tão incerto...
andorinha sem verão,
barco à deriva, sem norte.



Volta amor!
Bem sabes que ainda sou tua.
Meu abraço anda sem dono
e meu coração sem prumo...
Minha dor vive tão nua!
Despiu-se com o abandono
e pôs-se a vaguear sem rumo.



Volta amor!
Minha boca quer beber
nesse teu beijo molhado,
o doce mel - que é só meu! -
Quero cravar meu prazer,
o meu desejo rasgado,
no teu belo corpo ateu....




domingo, 2 de janeiro de 2011

A insustentável leveza da vida - Elen de Moraes







A insustentável leveza da vida


Elen de Moraes Kochman


Aflita, tua alma soluça... solitária,
Dilacerada em seu profundo desencanto,
Pela noite que te desce, desnecessária,
E te envolve com o negrume do seu manto.


Nos ruídos entrecortados e gementes,
O sofrimento intenso que teu Ser transpassa,
Sublima-se nas tuas forças transcendentes,
Na augusta e comovente fé que te encouraça.


Rosto pálido, encovado, num quê de espanto...
Espasmofilia. Máscara de tristeza.
Conquanto em tua face etérea um silente pranto,
Na alma, do Deus Onipotente, a certeza!


Ausência da palavra em tua voz combalida.
No corpo, a insustentável leveza da vida.





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